sexta-feira, 4 de março de 2011

Poema: Coisa Amar

Coisa Amar

Contar-te longamente as perigosas
coisas do mar. Contar-te o amor ardente
e as ilhas que só há no verbo amar.
Contar-te longamente longamente.

Amor ardente. Amor ardente. E mar.
Contar-te longamente as misteriosas
maravilhas do verbo navegar.
E mar. Amar: as coisas perigosas.

Contar-te longamente que já foi
num tempo doce coisa amar. E mar.
Contar-te longamente como doi

desembarcar nas ilhas misteriosas.
Contar-te o mar ardente e o verbo amar.
E longamente as coisas perigosas.
By Manuel Alegre

Poema: Amor de Fixação


Amor de Fixação

Há um caminho marítimo no meu gostar de ti.
Há um porto por achar no verbo amar
há um demandar um longe que é aqui.
E o meu gostar de ti é este mar.

Há um Duarte Pacheco em eu gostar
de ti. Há um saber pela experiência
o que em muitos é só um efabular.
Que de naufrágios é feita esta ciência

que é eu gostar de ti como um buscar
as índias que afinal eram aqui.
Ai terras de Aquém-Mar (a-quem-amar)

naus a voltar no meu gostar de ti:
levai-me ao velho pinho do meu lar
eu o vi longe e nele me perdi.

By Manuel Alegre

Obra Literária de Manuel Alegre

Manuel Alegre, além da política, dedicava-se também a literatura: a poesia e a ficção.
Escreveu inúmeros poemas musicados, como por exemplo a Trova do vento que passa, cantada por Adriano Correia de Oliveira, Amália Rodrigues, entre outros. Reconhecido internacionalmente, é o único autor português incluído na antologia Cent poemes sur l'exil, editada pela Liga dos Direitos do Homem, em França (1993). 
Em Abril de 2010, a Universidade de Pádua, em Itália, inaugurou a Cátedra Manuel Alegre, destinada ao estudo da Língua, Literatura e Cultura Portuguesas. ( http://www.dn.pt/inicio/artes/interior.aspx?content_id=1177225&seccao=Livros )
Recebeu os seguintes prémios literários: o Prémio Pessoa (1999) e o Grande Prémio de Poesia da Associação Portuguesa de Escritores (1998). 



POESIA:
    1965 - Praça da Canção
    1967 - O Canto e as Armas
    1971 - Um Barco para Ítaca
    1976 - Coisa Amar (Coisas do Mar)
    1979 - Nova do Achamento
    1981 - Atlântico
    1983 - Babilónia
    1984 - Chegar Aqui
    1984 - Aicha Conticha
    1991 - A Rosa e o Compasso
    1992 - Com que Pena – Vinte Poemas para Camões
    1993 - Sonetos do Obscuro Quê
    1995 - Coimbra Nunca Vista
    1996 - As Naus de Verde Pinho
    1996 - Alentejo e Ninguém
    1997 - Che
    1998 - Pico
    1998 - Senhora das Tempestades
    2001 - Livro do Português Errante
    2008 - Nambuangongo, Meu Amor
    2008 - Sete Partidas

FICÇÃO: 
1989 - Jornada de África
1989 - O Homem do País Azul
1995 - Alma
1998 - A Terceira Rosa
1999 - Uma Carga de Cavalaria
2002 - Cão Como Nós
2003 - Rafael

Biografia de Manuel Alegre


Manuel Alegre de Melo Duarte nasceu a 12 de Maio de 1936 em Águeda, no distrito de Aveiro. Filho de José de Faria e Melo Ferreira Duarte e de Maria Manuela Alegre de Melo Duarte.
A família de Manuel Alegre possui grandes referências na área da política e na área do desporto. O seu pai jogou na Académica e foi campeão de atletismo. O seu avô paterno, Mário Ferreira Duarte, introduziu, com Guilherme Pinto Basto, várias modalidades desportivas em Portugal,  deu também o seu nome ao antigo Estádio de Futebol de Aveiro. O seu avô materno, Manuel Ribeiro Alegre, pertenceu à Carbonária (uma organização secreta, sem ligações orgânicas à Maçonaria Portuguesa ou outras Obediências Maçónicas) e foi deputado à Assembleia Constituinte em 1911, bem como governador civil de Santarém. O seu bisavô paterno, Carlos de Faria e Melo (1º barão de Cadoro) foi administrador do Concelho de Aveiro. O seu trisavô paterno, Francisco da Silva Melo Soares de Freitas, fundador dos caminhos de ferro no Barreiro e primeiro visconde dessa localidade, esteve nas revoltas contra D. Miguel I, tendo sido decapitado.
Também Manuel Alegre se sagrou campeão nacional de natação e foi atleta internacional da Associação Académica de Coimbra nessa modalidade.
No romance Alma (1995), podemos encontrar retratada a sua infância e juventude.
Entra na Faculdade de Direito de Coimbra em 1956. Nos grupos de oposição de estudantes ao Salazarismo, começa o seu percurso político. Participou na fundação do Círculo de Iniciação Teatral da Academia de Coimbra e foi actor do Teatro de Estudantes da Universidade. Em 1960, publica poemas nas revistas Briosa (que dirigiu), Vértice e Via Latina, participando ainda na colectânea A Poesia Útil e Poemas Livres.
Em 1962 é mobilizado para Angola, onde é preso pela PIDE e condenado a seis meses de prisão na Fortaleza de S. Paulo, em Luanda, acusado de tentativa de revolta militar contra a Guerra do Ultramar. Dois anos depois regressa a Portugal. Porém, devido à hipótese de ser novamente detido e julgado, rende-se à clandestinidade e parte para o exílio.
Adere ao Partido Socialista em 1974, do qual foi dirigente nacional. Em 1975, estreia-se como deputado na Assembleia Constituinte. A partir do ano seguinte (1976) é deputado da Assembleia da República, pertencendo também ao I Governo Constitucional (de Mário Soares). 
Foi candidato a secretário-geral do PS em 2004, onde perdeu para Sócrates. No ano de 2006, foi candidato independente às eleições presidenciais, onde obteve mais votos que Mário Soares. Em 2010 anuncia a sua candidatura às eleições presidenciais de 2011, conseguindo o apoio do PS, do BE, do PDA, bem como dos dirigentes do MIC.


(Cartoon de Henrique Monteiro)

Para concluir, gostava de vos deixar algumas citações d' Quase um auto-retrato, uma pequena biografia feita pelo próprio, que se pode encontrar no seguinte site: http://www.manuelalegre.com/101000/1/index.htm 

"Aos vinte e poucos anos escrevi: “meu poema rimou com a minha vida”. Era ainda muito cedo, não sei sequer se é verdade..."

"Muito antes, lá pelos vinte, tinha lido uma frase de André Gide que me impressionou. Dizia ele: "a análise psicológica deixou de me interessar desde o dia em que cheguei à conclusão de que cada um é o que imagina que é." Até que ponto sou o que me imaginei ser?"

"Tenho desde pequeno a obsessão da morte. Não o medo, mas a consciência aguda e permanente, sentida e vivida com todo o meu ser, de que tudo é transitório e efémero e não há outra eternidade senão a do momento que passa."  

"Herdei de minha mãe uma certa energia, o gosto da intervenção. De meu pai, o desprendimento, uma irresistível e por vezes perigosa tendência para o desinteresse."